Cálculo de aposentadoria deve mudar

Projeto que acaba com o fator previdenciário faz benefício ser calculado pelos 3 últimos anos de contribuição
O governo corre contra o tempo para desarmar outra bomba nas contas da Previdência Social. O projeto do senador Paulo Paim (PT-RS), que trata do fim do fator previdenciário, ressuscita um critério de cálculo da aposentadoria anterior à reforma de 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso. A aposentadoria voltaria a ser calculada com base nos últimos três anos de contribuição. Atualmente, são utilizadas na conta 80% das melhores contribuições feitas desde 1994.
Se o projeto de Paim for aprovado sem mudanças, muitos brasileiros poderão contribuir com base no valor do salário mínimo (R$ 465) para a aposentadoria e nos últimos três anos pagar para receber o teto, que hoje é de R$ 3.218,90. Isso provocaria um forte aumento das despesas da Previdência.
Para o deputado Pepe Vargas (PT-RS), responsável por um projeto substitutivo ao de Paim, o impacto da volta da chamada "média curta" será mais danoso do que o fim do fator previdenciário. "Não haverá nem o critério escadinha (aumento gradual) que existia antes. A pessoa poderá contribuir com o mínimo e nos últimos meses elevar a contribuição com base no teto", ressaltou.
Vargas disse que a necessidade de financiamento da Previdência aumentaria em valor equivalente a 9,69% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2050 apenas com a adoção da média curta, segundo cálculos do Ministério da Previdência. Considerando o fim do fator previdenciário, esse "rombo" saltaria para 11,09% do PIB. Sem essa alteração, a necessidade de financiamento teria um aumento de 5,75% do PIB.
Para barrar esse rombo nas contas no longo prazo, o substituto de Vargas estabelece que o cálculo da aposentadoria seja feito com base em 70% das melhores contribuições. "Isso aumentaria o valor do benefício", destacou.
Na avaliação do deputado é insustentável para o equilíbrio fiscal aprovar, sem alterações, o projeto de Paim. Somente em 2010, conforme estudo da Consultoria de Orçamento e Fiscalização da Câmara, as despesas previdenciárias subirão R$ 2,53 bilhões com o fim do fator e alteração no cálculo da contribuição. Em 2011, esse valor salta para R$ 3,859 bilhões.
Na terça-feira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou o relatório do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-S) favorável ao projeto de Paim. Agora, o texto segue para o plenário. O presidente da Casa, Michel Temer, já assumiu o compromisso com Faria de Sá de colocar o texto na pauta de votação assim que terminar a apreciação dos projetos do pré-sal. A ideia é evitar o desgaste ainda maior do governo com os aposentados.
Segundo Faria de Sá, a extinção do fator previdenciário não é o fim do mundo. Ele disse ainda que não aceitará a alternativa proposta por Pepe Vargas, que cria um novo critério de cálculo do benefício, a chamada regra 95/85.
Com ele, as pessoas só poderiam se aposentar com benefício integral quando a idade, somada ao tempo de contribuição, resultasse em 95 anos (homens), ou 85 (mulheres). O relator na CCJ disse estar disposto a negociar a média de contribuição com o governo. "Nesse ponto, aceito discutir alterações no projeto", afirmou.
O ex-ministro da Previdência Social e atual superintendente do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar, José Cechin, destacou que o fim do fator previdenciário e a volta do cálculo do benefício com base nos três últimos anos de contribuição é um retrocesso. Isso porque as pessoas não terão mais motivos para adiar as aposentadorias e, além disso, muitos brasileiros poderão pagar o mínimo de contribuição para elevar o valor apenas nos últimos anos de trabalho.
Aposentados não querem discutir regra sugerida
A alternativa dada pelo deputado Pepe Vargas (PT-RS) ao fim do fator previdenciário é a criação de uma fórmula que considera a soma da idade e dos anos de contribuição aos cofres da Previdência. A proposta, conhecida como regra 95/85, prevê que as pessoas só poderão se aposentar com benefício integral se a soma da idade e do tempo de contribuição resultar em 95 anos no caso dos homens e 85 para as mulheres.
Os aposentados, no entanto, não querem discussão nesse sentido. Para as entidades ligadas aos aposentados, esse desenho alternativo também abocanha parte do valor dos benefícios. Por isso, vão pressionar para garantir apenas o fim do Fator Previdenciário. Isso preocupa o governo, pois o fator previdenciário impede aposentadorias precoces. Desde que foi criado em 1999, já propiciou uma economia de R$ 10 bilhões.
Pela fórmulade Vargas, um homem precisaria ter, pelo menos 60 anos, para se aposentar com o valor integral. Isso porque a soma da idade e da contribuição deve ser equivalente a 95 anos, e o atual tempo mínimo de contribuição, de 35 anos, continuaria valendo.
Já a mulher, teria que ter pelo menos 55 anos. Nesse caso, com a soma da idade (55) mais 30 anos de contribuição se atinge os 85 anos, exigidos na proposta. A solicitação pode até ser feita com uma idade menor, mas, o valor do benefício cairia. Na prática, a regra institui uma idade mínima para a aposentadoria.
O relator do projeto do senador Paulo Paim, que extingue o fator previdenciário, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) já avisou que pretende barrar no plenário o fator 95/ 85, se for apresentado pelo governo.
Proposta alternativa pode causar perdas
Regra dos 85/95 prejudica quem já estava contribuindo no regime anterior
Antônio da Silva Nobre, de 64 anos, escapou da polêmica sobre as possíveis mudanças nas atuais regras da aposentadoria brasileira. Desde o mês passado, o ex-zelador passou a fazer parte do universo dos aposentados. O cearense, que vive em São Paulo desde 1972, contribuiu com a Previdência por 35,2 anos e, a partir de agora, receberá R$ 1.953 do Instituto Nacional de Previdência Social (INSS).
"Há dois anos eu tive a ideia de parar de trabalhar e fui até uma agência do INSS para saber quanto ganharia. Calcularam que seria uns 70% do que eu consegui atualmente. Sugeriram que eu contribuísse por mais um tempo e foi o que eu fiz", conta Nobre.
Segundo o consultor previdenciário Renato Follador, no caso do zelador aposentado a regra dos 85/95 não seria vantajosa. Segundo cálculos, Nobre teria uma perda de remuneração e passaria a receber do INSS por volta de R$ 1,8 mil.
O projeto do deputado federal Pepe Vargas (PT-RS), chamado fator 85/95, prevê que a soma da idade do trabalhador e do tempo de contribuição alcance 85 no caso das mulheres e 95 no caso dos homens para que o valor pago pela Previdência seja 100% da médias dos salários de contribuição.
A situação de desvantagem de Nobre, segundo Follador, se repetiria no caso da aposentada Mary Maurício Lima, de Fortaleza. Ela tem 63 anos e se aposentou aos 55 anos, depois de 38 anos de contribuição. A ex-secretária recebe em torno de R$ 2,5 mil. Mas a aposentadoria de Mary seria menor, explica Follador, se ela tivesse se submetido ao fator 85/95.
José Cechin, ex-ministro da Previdência e sócio do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), avalia que um dos problemas em torno da polêmica do fator previdenciário é que o governo, desde a sua criação, não conseguiu "explicar que não se trata de algo ruim, injusto. A sociedade nunca soube direito do que se tratava e agora o novo projeto tem chances de emplacar", diz.
Para Luiz Eduardo Afonso, professor da Universidade de São Paulo, caso a regra do 85/95 passe pelo Congresso, será necessário ter uma regra de transição: "Do contrário, corre-se o risco de uma enxurrada de reclamações na justiça de quem se sentir prejudicado com a regra atual ou com a 85/95. Representaria o risco de um passivo enorme ao País".
Longa noite no Congresso Grupo pressiona deputados para a votação de reajuste
Dez horas de ontem e a aposentada Maria Norberta da Fonseca,72 anos, estava deitada no chão de granito do corredor de acesso ao Salão Verde da Câmara, com outros aposentados. Desde a tarde do dia anterior, um grupo de cerca de cem manifestantes pressionava os deputados para a votação da proposta de estender o mesmo índice de reajuste do salário mínimo para as aposentadorias acima desse valor.
Com a cabeça apoiada na bolsa como um travesseiro, ela contou histórias de aposentados que estão com as aposentadorias achatadas por causa da aplicação de índices diferentes para os reajustes do salário mínimo e dos benefícios acima desse valor.
CARAVANA
A aposentada de Minas Gerais faz parte da caravana da Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap) que, rotineiramente, faz manifestação às terças e quartas-feiras na Câmara.
Dessa vez, a segurança da Casa bloqueou a passagem do grupo para o Salão Verde e a solução foi dormir no corredor. O senador Paulo Paim (PT-RS), autor desse e de outros dois projetos que beneficiam os aposentados, esteve na madrugada levando apoio ao grupo.
O projeto do reajuste das aposentadorias chegou a entrar na pauta de votação neste mês, mas foi retirado pelos governistas. O Executivo argumenta que a aprovação da proposta resultará em um rombo nas contas públicas.
Ontem, o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), condicionou a votação dos projetos que beneficiam os aposentados a um acordo entre os líderes.
FATOR PREVIDENCIÁRIO
Além dessa proposta, está pronta para votação no plenário o projeto que acaba com o fator previdenciário, o mecanismo criado para adiar as aposentadorias. Esse projeto foi aprovado na terça-feira na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
"Só ouvindo todos os líderes que os projetos vão para a pauta. Não dá para ter um grande litígio no plenário", disse Temer.
Ele defendeu que o governo se reúna com os representantes dos aposentados para chegar a um acordo.
"Tem de haver um entendimento com o governo. Não é possível que os aposentados venham diariamente à Câmara sem uma solução acordada com o governo", disse.
O governo propõe conceder um aumento em torno de 6% para as aposentadorias com valor acima do salário mínimo, o que significaria um aumento real de 2,5%, além da inflação. Além disso, quer fixar uma nova regra para substituir o fator previdenciário. A Cobap não concorda com a alternativa proposta pelo governo.
FONTE : ESTADÃO